Questão 1
(UEPB) O Auto, jogo linguístico de origem medieval, peça em que certas atitudes consideradas “pecaminosas” eram “questionadas” através de uma carga de humor, foi incorporado à produção literária brasileira (ou literatura feita no Brasil, como bem fez o padre José de Anchieta com a sua escrita evangelizadora e moralística), de forma que, mesmo distante no tempo e no espaço, este tipo de texto alcança um vasto público, como é o caso de O auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. Considerando os fragmentos abaixo, marque a alternativa correta:
[...] PADRE É, mas quem vai ficar engraçado sou eu, benzendo o cachorro. Benzer motor á fácil, todo mundo faz isso, mas benzer cachorro?
JOÃO GRILO É, Chicó, o padre tem razão. Quem vai ficar engraçado é ele e uma coisa é benzer o motor do major Antônio de Morais e outra é benzer o cachorro do major Antônio de Morais. […]
BISPO Então houve isso? Um cachorro enterrado em latim?
JOÃO GRILO E então? É proibido? BISPO Se é proibido? Deve ser, porque é engraçado demais para não ser. É proibido! É mais do que proibido! Código Canônico, Artigo 1627, parágrafo único, letra k. Padre, o senhor vai ser suspenso [...]
JOÃO GRILO É mesmo, é uma vergonha. Um cachorro safado daquele se atreve a deixar três contos para o sacristão, quatro para o padre e seis para o bispo, é demais. [...]
BISPO É por isso que eu vivo dizendo que os animais também são criaturas de Deus. Que animal interessante! Que sentimento nobre!
a) O Auto da Compadecida mantém relação direta com os autos medievais a partir somente do tipo formal de texto - auto - porque o conteúdo a ser desenvolvido neste tipo de literatura varia no tempo e no espaço de forma que um escritor contemporâneo não poderia recuperar nem atualizar esta forma textual.
b) “Os vícios dos homens e da sociedade” são apenas uma forma bem humorada de perceber o mundo, de entreter a razão, de valer o texto por si mesmo, independente de alusão ou denúncia a que faça referência porque o riso, e somente o riso, é o que está em primeiro plano neste tipo de texto.
c) O Auto da Compadecida não faz nenhuma alusão ao teatro de Gil Vicente porque dista deste no tempo e no espaço, logo os “vícios dos homens e da sociedade” não poderiam ser os mesmos. O texto de Ariano Suassuna é apenas uma paródia dos autos medievais.
d) O Auto da Compadecida não tem caráter moralístico porque a literatura de ficção nunca se propôs a discutir aspectos relacionados a contextos socioculturais, uma vez que se volta para o plano estético, desconsiderando qualquer alusão a práticas culturais, a papéis sociais e outros.
e) “Os vícios dos homens e da sociedade estão em todas as peças de Gil Vicente, representados por frades libertinos, magistrados corruptos, mulheres adúlteras [...] tipos que proliferam quando as sociedades esquecem os valores éticos e morais” (João Domingues Maia), característica observada na peça de Ariano Suassuna O Auto da Compadecida.
Questão 2
(UFOP) A respeito do Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, é incorreto dizer que:
a) incorporando romances e histórias populares do Nordeste brasileiro, é um texto cuja vinculação com os mistérios e moralidades medievais é bastante nítida.
b) tem fortes particularidades de um metateatro, principalmente na construção da personagem Palhaço.
c) apresenta uma longa rubrica inicial, com precisas indicações para o diretor, para o cenógrafo e para o sonoplasta.
d) desprezando a cultura religiosa das personagens que habitam seu cenário, tem um desfecho inverossímil e incompatível com o contexto que representa.
e) é um texto estruturado com excepcional dinamismo, dado que os diálogos são curtos e as ações muito rápidas.
Questão 3
Sobre a obra o Auto da Compadecida, é correto afirmar:
I. O texto propõe-se como um auto. Dentro da tradição da cultura de língua portuguesa, o auto é uma modalidade do teatro medieval cujo assunto é basicamente religioso. Assim o entendeu Paula Vicente, filha de Gil Vicente, quando publicou os textos de seu pai, no século XVI, ordenando-os principalmente em termos de autos e farsas.
II. O texto propõe-se como resultado de uma pesquisa sobre a tradição oral dos romanceiros e narrativas nordestinas, fixados ou não em termos de literatura de cordel. Propõe, portanto, um enfoque regionalista ou, pelo menos, organiza um acervo regional com vistas a uma comunicação estética mais trabalhada.
III. A primeira intenção do texto está em moldá-lo dentro de um enquadramento do teatro medieval português ou, mais precisamente, dentro das perspectivas do teatro de Gil de Vicente, que realizou o ideal do teatro medieval um século mais tarde, isso no século XVI, portanto, em pleno Quinhentismo (estilo de época).
a) Apenas I
b) Apenas II
c) Apenas III
d) Apenas I e II
e) Todas estão corretas.
Questão 4
Sobre a peça O santo e a Porca, de Ariano Suassuna, é incorreto afirmar:
a) O Santo e a Porca é uma peça que, aparentemente, trata de um tema simples, que é a avareza, em tom de humor por ser uma comédia.
b) A peça não contribui para a reflexão e divulgação da cultura nordestina.
c) As personagens estão intimamente ligadas ao enredo e vice-versa. Essas são as duas forças principais que regem um texto dramático.
d) Na apresentação de sua peça O Santo e a Porca (1957), Ariano Suassuna subintitula-a de "Imitação Nordestina de Plauto", referindo-se à Aulularia, do autor latino Plauto.
e) O texto promove uma reflexão sobre a relação do ser humano com o mundo físico (representado pela porca) e o espiritual (representado por Santo Antônio).
Resposta Questão 1
Alternativa E.
As semelhanças dos dois autores em relação à construção das personagens são bem evidentes: cada personagem representa uma classe social - que é criticada - e, às vezes, possui um nome que identifica a função que exerce na comunidade onde vive ou apelidos cômicos, como acontece com João Grilo, Chicó, a mulher do padeiro. Gil Vicente identifica seus personagens como mercadores, padres, pobres etc., sempre fazendo alusão às classes da hierarquização social.
Resposta Questão 2
Alternativa D.
Uma das linhas de força da obra é a carga religiosa, especificamente o catolicismo, que se articula na lógica interna da peça por meio da contraposição entre “bem e mal”. Trata-se, na verdade, de um desdobramento da forte cultura religiosa do nordestino, que se apega a Deus e teme as influências do mal. Essa intervenção do elemento religioso deriva também da tradição do teatro medieval (ou mesmo vicentino), já que, durante a Idade Média, as manifestações artísticas estiveram sempre vinculadas à Igreja.
Resposta Questão 4
Alternativa B.
A peça contribui, sim, para a reflexão e divulgação da cultura nordestina. Os personagens representam diferentes classes sociais e existe uma crítica à vida difícil no Nordeste. A personagem da empregada Caroba, por exemplo, simboliza a classe social mais baixa da população, que, por não ter outras oportunidades, acaba tramando para se dar bem.